Série Festas Juninas - Caruru

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O Culinária & História traz para finalizar a série "Festas Juninas" uma prato bastante conhecido no Brasil e no mundo: o caruru. Originalmente africano, era bastante utilizado em rituais do candomblé. Pode ser apreciado juntamente com acarajé e pedaços de carne, frango ou peixe. Guilherme Piso afirma que este prato é indígena, e designava uma erva medicinal e alimentício. 

Conta em seu livro Historia Naturalis Brasiliae, que o médico Maurício de Nassau diz que "come-se este bredo (caruru) como legume e cozinha-se em lugar de espinafre...". Outro relato conta que em 1820, na Amazônia, por Von Martius, cita o "caruru-açu", durante uma refeição com nativos, próximo ao rio Madeira, quando experimentou "um manjar de castanhas socadas com uma erva parecida com o espinafre...".

1. Origem Afro-Brasileira

O caruru tem influência da cultura iorubá, trazida ao Brasil pelos escravizados africanos. Originalmente, era um prato feito com quiabo e servido em rituais religiosos do Candomblé, especialmente para o orixá Xangô (deus do fogo e da justiça) e Iansã (orixá dos ventos e tempestades).

2. Dia de Cosme e Damião

No Nordeste, principalmente na Bahia, o caruru é um prato típico das festas de Cosme e Damião (27 de setembro), quando são feitas grandes paneladas para compartilhar com a comunidade e crianças, em um ritual chamado "Caruru dos Sete Meninos".

3. Ingredientes Sagrados

Tradicionalmente, leva quiabo, camarão seco, amendoim, castanha de caju, azeite de dendê e outros temperos. O quiabo, por ser considerado um alimento de forte ligação espiritual, não pode ser cortado com faca em algumas tradições—deve ser quebrado com as mãos.

4. Variações Regionais

Além da versão baiana, outros estados têm suas variações. Em Pernambuco, por exemplo, o caruru pode levar carne de sol ou charque. Já em Minas Gerais, há uma versão com frango e linguiça.

5. Prato Coletivo

O caruru é um símbolo de compartilhamento. Antigamente, era servido em grandes panelas de barro e comido no chão, em volta da panela, reforçando os laços comunitários.

6. Relação com o Vatapá

Muitas vezes, o caruru é servido junto com vatapá e acarajé, formando uma combinação clássica da culinária baiana.

7. Nome Curioso

A palavra "caruru" vem do termo africano "kalalu", que significa "ervas para comer". Em algumas regiões da África, pratos semelhantes são feitos com folhas verdes, não só com quiabo.

Agora que já conhecemos mais um pouco sobre a história do Caruru, vamos à receita dessa delícia

Ingredientes:

  • 100 quiabos
  • 1 xícara de castanha de caju
  • 100 g de amendoim torrado e moído sem casca
  • 2 xícaras de camarões defumados, descascados e moídos
  • 2 cebolas grandes
  • 2 xícaras de azeite de dendê
  • 3 limões
  • 2 colheres de sopa de sal
  • 4 xícaras de água quente
  • pimenta
  • gengibre
  • alho

Modo de preparo:

Lava-se os quiabos, enxugando bem para não formar baba quando picado. 
Coloque os camarões secos e moídos a cebola ralada, alho, sal, castanha e amendoim para refogar no azeite de dendê. Ponha os quiabos picados, a água e as colheres de sopa de limão para cortar a baba. 
Adicione ainda alguns camarões secos, inteiros e grandes. Cozinhe tudo até ficar pastoso. 
Quando os caroços dos quiabos estiverem bem rosados, retire do fogo.
Na festa de São Cosme e São Damião, quando o caruru é de promessa, costuma-se colocar sete quiabos inteiros. O convidado que tiver no seu prato, ao acaso, um desses quiabos, fica na obrigação de oferecer ao santo outro caruru.
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Referências Bibliográficas

CASCUDO, Luís da Câmara. História da Alimentação no Brasil. 3. ed. São Paulo: Global Editora, 2011.   (Livro clássico sobre culinária brasileira, com informações sobre a origem africana do caruru.)

LODY, Raul. Tem Dendê, Tem Axé: Comidas dos Orixás na Bahia. Rio de Janeiro: Pallas, 2018.  (Aborda a relação do caruru com o Candomblé e os orixás, como Xangô e Iansã.)

SANTOS, Deoscóredes M. dos (Mestre Didi). Axé Opô Afonjá: Notas Etnográficas. Salvador: Fundação Pierre Verger, 2002. (Discute o caruru como comida ritual no Candomblé, incluindo o preparo tradicional.)

VERGER, Pierre. Orixás: Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo. 7. ed. Salvador: Corrupio, 2018. (Traz informações sobre a origem iorubá do prato e sua adaptação no Brasil.)

PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. (Menciona a conexão do caruru com festas religiosas, como a de Cosme e Damião.)

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO ARTÍSTICO E CULTURAL DA BAHIA (IPAC). Dossiê da Comida Baiana. Salvador: IPAC, 2018.  (Documento oficial sobre a culinária baiana, incluindo o caruru como patrimônio cultural.)

ALMEIDA, Manuel Raimundo de. Cozinha Afro-Brasileira: Um Estudo Antropológico. Recife: Editora Massangana, 2010.  (Analisa variações regionais do caruru, como as versões pernambucana e mineira.)